O biólogo e policial militar Fábio Ferrão esteve à frente da construção das duas passagens que ajudam a evitar o atropelamento e o isolamento de diversas espécies que vivem nos parques da Zona Norte

No final de 2018, duas fêmeas de macaco-prego foram atropeladas na Avenida Santa Inês, Zona Norte de São Paulo. Na necropsia, descobriram que eram mãe e filha. A hipótese é que a filha caiu na avenida durante uma travessia pelas árvores e a mãe, que estava grávida, foi atrás para salvá-la.

Depois desse acidente, o biólogo e subtenente da Polícia Militar Fábio Ferrão Videira, 46 anos, que é Coordenador Técnico da Comissão do Verde e Meio Ambiente do Centro Médico da Polícia Militar, assumiu a frente do trabalho de construção de uma passagem superior de fauna sobre a Avenida Santa Inês, ligando dois fragmentos do Parque Estadual Alberto Löfgren (o Horto Florestal) que são cortados pela avenida.

Biólogo e policial militar, Fábio Ferrão assumiu a frente da construção da passagem superior de fauna

Com mais de 20 metros de comprimento, a estrutura foi instalada no último dia 4 de abril e mostra como o envolvimento das pessoas faz a diferença. Fábio montou a passarela, feita de cordas, na casa dele com a ajuda da esposa e dos filhos em uma ação totalmente voluntária e pessoal. Foi ele, também, quem articulou o engajamento de órgãos públicos e empresas na construção dessa estrutura. A consultoria ambiental ViaFauna bancou a compra dos materiais para a construção da passarela e a Enel fez a instalação da estrutura, que fica acima da fiação. Houve ainda o envolvimento da Divisão de Reservas e Parques Estaduais do Instituto Florestal, que viabilizou os encaminhamentos e apoio logístico institucional, e do Ecólogo e Pesquisador Científico Márcio Port, da Reserva da Biosfera do Cinturão Verde do Instituto Florestal, que indicou o melhor local a ser instalada a passagem.

Instalação da passagem superior de fauna na Avenida Santa Inês, Zona Norte. Foto: Divulgação

Animais não devem viver isolados

O Parque Alberto Löfgren, o Parque da Cantareira e a Invernada do Barro Branco (área da Polícia Militar que abriga algumas estruturas, como o Centro Médico onde Fábio trabalha) formam um complexo de áreas verdes na Zona Norte da cidade dividas por ruas, avenidas, casas e estabelecimentos comerciais. “Quando há fragmentação de uma área, a fauna pode ficar alijada. Então, além de atropelamentos, os animais podem sofrer com o isolamento, que também traz muito impacto negativo para o ecossistema”, explica Fernanda Abra, bióloga da ViaFauna, que fará o monitoramento da passarela durante um ano. Os animais podem, por exemplo, ficar com o acesso restrito a alimentos e parceiros sexuais, o que vai influenciar na reprodução e preservação das espécies.

A câmera Trap, equipamento usado para monitorar a fauna e que foi instalado na passarela, vai mostrar aos pesquisadores quais são os animais que usam a estrutura, quando eles vão começar a aparecer (isso pode levar bastante tempo) e quais sãos os hábitos deles. Existe, inclusive, uma grande expectativa pela volta dos bugios, que existiam em abundância naquela região e foram todos mortos no ano passado, quando houve o surto de Febre Amarela.

Fernanda Abra, da ViaFauna, configura a Câmera Trap, que vai monitorar a fauna local durante um ano

É fundamental que eles reapareçam porque esses animais são indicadores biológicos da Febre Amarela, ou seja, quando eles aparecem doentes é um sinal da circulação do vírus e um alerta para a intensificação de políticas públicas, como a vacinação. Segundo o Conselho Federal de Biologia, com o desaparecimento desses mamíferos há um desequilíbrio ambiental, situação que leva os mosquitos transmissores, que habitam o alto das árvores e que têm preferência por picar macacos, a voarem mais baixo e a procurarem uma fonte alternativa de alimentação, que são os seres humanos, principalmente os que adentram as matas, pois se tornam alvos potenciais de picadas e, consequentemente, correm risco de serem infectados pelo vírus da Febre Amarela. É sempre bom lembrar que o macaco não transmite o vírus da Febre Amarela para o homem.

Histórico

Essa não é a primeira vez que Fábio toma a frente desse tipo de iniciativa. Em 2011, ele se envolveu em um estudo sobre os bugios que habitavam a Invernada e, em 2014 e 2015, esteve à frente do projeto que construiu uma passagem superior de fauna com 186 metros divididos em cinco módulos. Ela passa sobre a avenida Luis Carlos Gentile de Laet e sobre a rua Mamud Rahd, além de ter trechos dentro da área da Invernada e funciona como uma passagem para a fauna que vem dos parques da Cantareira e do Horto. A construção e instalação envolveu a Polícia Militar, a CET, a então Eletropaulo (hoje Enel), o Grupo Escoteiro Primeiro de Brownsea , além de comerciantes locais. Nesse movimento, houve muito trabalho voluntário, assim como na construção desta nova passarela. “Isso que me deixou satisfeito. A vizinhança trouxe uma problemática que resolvemos com sucesso. De certo modo, é assim que se faz”, diz Fábio.

Ele conta que depois de um ano da passarela instalada os animais começaram a aparecer. Os registros mostram Bugios (lembrando que foi antes do surto de Febre Amarela), saguis de tufo branco, tufo preto e híbridos, cuícas, ouriço cacheiro, saruês e caxinguelês. Biólogo e ornitólogo com MBA em gestão e tecnologias ambientais, Fábio tem uma paixão pessoal pelos animais e conta que quer ver a natureza e as pessoas convivendo em harmonia. E se cada um fizer um pouco, doar tempo ou conhecimento para essas causas, poderemos ter uma cidade mais sustentável.

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7 comentários

  1. Ressalto a grandiosa ajuda da Bióloga Priscila Comassetto Maciel da Enel, a qual me ensinou a técnica de construção da Passagem Superior de Fauna (PSF), bem como, da Bióloga Fernanda Abra da ViaFAUNA, do Ecólogo Márcio Port do IF, do Eng. Agrônomo Fernando Descio da Diretoria do IF, das amigas biólogas da Divisão da Fauna Silvestre da SVMA, dos colegas da Comissão do Verde e Meio Ambiente do Centro Médico da Polícia Militar, de amigos(as) que apoiaram os projetos e principalmente de minha esposa Dinêila, de meus filhos (Bruna e Arthur), de minha mãe Luzia e de meu Tio Lano.

  2. Abaixo, encontram-se outros links sobre o assunto da matéria em questão.

    Publicação realizada no Instituto Florestal
    https://www.infraestruturameioambiente.sp.gov.br/institutoflorestal/2019/04/if-e-parceiros-instalam-passagem-de-fauna-em-avenida-que-atravessa-o-horto-em-sao-paulo/?fbclid=IwAR0Z3BYPtxT3YeAs2-JpWPerD8mnTJ680GSG5dIX4e3cF4QJ29bm50YXJUY

    “MOBILIZAÇÃO CONJUNTA PARA INSTALAÇÃO DE PASSAGEM SUPERIOR DE FAUNA” em parceria entre o IF-SMA, C Med-PMESP, ViaFAUNA e Enel
    Na data de 04abr19, instalamos uma Passagem Superior de Fauna sobre a Avenida Santa Inês, a fim de permitir a travessia da fauna arborícola. Veja no link abaixo:
    https://m.facebook.com/story.php?story_fbid=10218764887530354&id=1145028249&sfnsn=mo

  3. Série Passear e Cuidar: Bugio – Passagem de Fauna, a qual retrata uma das passagens superior de fauna retratada na matéria acima “Como e por que o Horto Florestal ganhou mais uma passagem superior de fauna”.

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