Há cerca de dois meses, participei de uma oficina para a confecção de iscas para capturar abelhas nativas brasileiras. Já fazia tempo que eu queria fazer estas iscas e fui me aventurar por mais essa descoberta. Poderia ter feito uma delas apenas seguindo tutoriais na internet – há vários disponíveis – mas fazer uma oficina presencial é mais interessante. Tem outras pessoas que questionam, contam suas experiências, trazem novos olhares. E teve a palestra do Gerson Pinheiro, da ONG SOS Abelhas Sem Ferrão, que trouxe tanta informação sobre esse universo que a confecção da isca se tornou, pra mim, a parte menos importante.

Falar de abelhas é falar de um universo particular. As bichinhas são organizadas, racionais, trabalham para sobreviver, produzem uma série de produtos (mel, própolis, cera etc) e ainda são fundamentais para manter a biodiversidade no mundo e alimento no nosso prato.

Separei em perguntas os pontos que considero fundamentais na introdução ao universo das abelhas nativas. Porque, sim, isso aqui é apenas uma introdução. Sou eu compartilhando com vocês o que aprendi nessa aula sobre abelhas nativas sem ferrão. Pela complexidade da vida dessas bichinhas, há muito mais para aprender.

Todas as abelhas nativas são sem ferrão?

Não. Existem abelhas com e sem ferrão. São 730 espécies nativas no país e cerca de 300 não possuem o ferrão.

Por que algumas não tem ferrão?

Isso tem a ver com o processo evolutivo das espécies. Formigas, vespas e abelhas vieram de um ancestral comum. No início, todas tinham ferrão e, vejam só, eram carnívoras. Porém, uma parte delas começou a comer insetos cobertos de pólen e, ao longo do tempo, estas espécies ficaram com o pólen como alimento. Com essa dieta vegetariana, as abelhas não precisaram mais deste tipo de defesa e, portanto, não valia a pena gastar energia para produzir e manter o ferrão, que acabou atrofiado.

Mas, não ter ferrão não quer dizer que as abelhas nativa não se defendem. O que elas fazem é usar outros recursos para essa função, como, por exemplo, se enrolar no cabelo das pessoas (como faz a mandaguari amarela) ou voar bem perto dos olhos.

Qual a diferença entre as abelhas nativas, a Apis mellifera e a abelha africanizada?

São espécies diferentes. A Apis mellifera veio da Europa e a africanizada surgiu aqui no Brasil, do cruzamento entre a Apis e a abelha africana. A Apis foi introduzida no Brasil por volta de 1860, com os jesuítas, que trouxeram os enxames por causa da cera clara usada para fazer vela. Por ser mais escura, a cera produzida pelas abelhas nativas não interessava. E por que é mais escura? Por causa do própolis que as abelhas colocam na cera logo depois de produzi-la para evitar a proliferação de fungos e bactérias. Por viverem em um clima temperado, mais seco e frio, as abelhas europeias não usam tanto própolis e a cera fica mais clara. Já no nosso clima tropical, mais quente e úmido, as abelhas produzem a cera e logo introduzem o própolis, que é um antibactericida e fungicida.

Uma vez por aqui, essas abelhas européias começaram a ser usadas na produção de mel. Porém, a produtividade era considerada baixa. E foi para desenvolver pesquisas que ajudassem a melhorar a produção de mel que o pesquisador Warwick Estevan Kerr trouxe algumas rainhas africanas para o Brasil, em 1956. Porém, um erro no manejo das colméias fez com que essas abelhas escapassem e cruzassem com as européias, espalhando seus genes pelo Brasil e pelo mundo (é sério isso).

Tá, mas as abelhas europeias e africanizadas também não polinizam? Por que, então, se preocupar tanto com as nativas?

Por causa da diversidade e também do respeito e reverência ao que é nativo. Existem 730 espécies nativas no país, sendo que cerca de 300 são sem ferrão. Então, por que a gente precisa focar em apenas duas espécies exóticas?

A principal função da abelha não é produzir mel, mas sim polinizar, ou seja, espalhar plantas por aí. E aí, quanto mais diversdade tiver, melhor. Como evoluíram com a nossa mata nativa, essas abelhas são mais eficientes e mais adaptadas a nossa flora. Os dados mostram que 75% das plantas com flores são polinizadas por abelhas. No Cerrado, esse número ultrapassa 90%.

Existe, ainda, a interdependência de algumas espécies com determinadas abelhas. Um exemplo é o Maracujá, uma fruta nativa que depende da abelha mamangava (que tem ferrão) para ser polinizada. Por questões morfológicas, essa é a única abelha que consegue carregar o pólen de uma flor para a outra. Ou, seja, sem ela, não teríamos maracujá.

A introdução da Apis no nosso meio ambiente trouxe mais concorrência. Apis e nativas são abelhas que já competem entre si. Só que a Apis também compete com outros animais da nossa fauna silvestre. “Aquele oco onde teria ninho de arara ou sagui, tem enxame de apis”, diz Gerson.

Eu posso ter abelhas sem ferrão na minha casa?

Pode. O Gerson tem 70 caixas de abelhas na casa dele. Claro, ele ensina as pessoas sobre esse universo. Mas quem quiser, pode ter sim. Exige cuidado, paciência e aprendizado. O melhor caminho é pesquisar na internet e e conversar com quem já faz isso para começar a aprender. Eu ainda não capturei o meu enxame, mas já observo as abelhinhas quando estão voando no meu jardim!.

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