Durante um ano, todos os dias, eu passava em frente a uma casa que deixava à vista, pelas frestas do portão, uma horta com manjericão, chuchu, abacaxi, alface, couve e uma variedade imensa de plantas, que mudavam a cada época do ano.

Teve uma outra vez que, andando pela avenida Francisco Matarazzo, na Zona Oeste da cidade, parei na pequena horta em frente ao Senac. Assim, na calçada, pra qualquer um ver, tocar, colher.

Também convivo quase que diariamente com a horta dentro do parque Ceret, que embora cercada, fica à vista de quem gosta de caminhar sobre a terra batida nas extremidades do parque. São funcionários que cuidam – e consomem. É bonito de ver.

Pois é, foi andando e vivendo em São Paulo que aprendi a observar uma horta. Sim, eu já havia convivido com o básico – couve, manjericão, erva cidreira – na casa dos meus pais. Mas, como sempre digo, tem algo de encantador e diferente em ver uma horta no meio de São Paulo, a cidade cinza, onde o que menos se espera é encontrar um plantação entre os prédios.

Conviver com essas hortas pelo caminho me fez prestar mais atenção no movimento de hortas urbanas.

As hortas comunitárias – como a Horta das Corujas, Horta da Saúde e Horta das Flores – são cuidadas por grupos de voluntários empenhados em fazer com o que o espaço seja produtivo, saudável, sustentável e acessível. Tem ainda as hortas comerciais, como as que ficam em São Mateus, na Zona Leste, e são fonte de renda para muitas famílias e de alimento saudável para quem acessa essa produção.

Mas as funções destas hortas dentro da cidade vão muito além da produção de alimentos. Olha só:

Resgatar a cidadania

Uma horta não é apenas um lugar de plantar. É, na verdade, um espaço para o exercício da cidadania. Em grupo, as pessoas precisam aprender a conviver, a tomar decisões, a serem responsáveis. Como diz a jornalista e ativista Cláudia Visoni, “uma horta oferece mais do que salsinha, cebolinha e PANC (Plantas Alimentícias Não Convencionais). É uma experiência republicana, política e cidadã. Estamos acostumados a querer que o estado resolva tudo, mas ele não resolve. Esse tipo de ocupação oferece a oportunidade de negociar, dialogar, desenvolver a resiliência”.

Melhorar o espaço urbano

Quando um espaço é transformado em horta – seja em uma praça, parque ou mesmo na calçada – automaticamente ele acaba por trazer benefícios urbanísticos para aquele local. Se o lugar ficar mais legal e mais seguro, será mais difícil alguém mexer no que está funcionando. A horta vai ter apoiadores e, certamente, vai ter mais gente querendo aquele espaço do que não querendo.

Além disso, os mutirões e cuidados regulares levam uma ocupação saudável para o espaço e são capazes de o transformar. Um lugar usado pela pessoas é sempre mais seguro.

Tem ainda as questões ambientais relacionadas à cidade. Uma horta é mais um espaço verde e ajuda a combater ilhas de calor, a deixar o solo mais permeável, a umidificar o ar e a atrair biodiversidade.

Aumentar áreas de lazer e convivência disponíveis

Um espaço verde e saudável é um convite à convivência. Por isso, as hortas acabam por se transformar em lugares de encontro, de lazer, de prática de atividade física e, claro, de educação ambiental.

O simples estar na horta já ensina muito. “Muita gente vai na horta só pra colher, ou seja, continua no “esquema supermercado”, sem entender o sistema de produção. Ainda assim, é uma reconexão, porque a pessoa vai ficando naquele lugar até voltar a colocar a mão na terra, ou observar a natureza, se encantar por uma borboleta, perder o medo das abelhas e dos insetos. E aí começa a se ver como parte daquilo. É uma mudança de olhar a partir de uma vivência que muitas vezes a gente nem tem mais percepção”, diz Diego Ramos, criador do projeto Flores no Cimento.

Colocar as pessoas em contato com PANC e sazonalidade

Cultivar uma horta é se atentar à sazonalidade, algo do qual estamos bastante dissociadas na cidade. Plantando, mesmo que em um espaço pequeno, é possível saber quando brota a abobrinha, o mamão, o manjericão, o tomate e outras plantas. Além disso, as hortas urbanas comunitárias costumam ter bastante espaço para PANC (Plantas Alimentícias não Convencionais), mais simples de cultivar e muitas vezes espontâneas, o que representa um incremento na diversidade alimentar das pessoas.

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3 comentários

  1. Maisa,
    Amei o conteúdo do site Verde SP! As matérias são muito interessantes e despertam interesse dos que passam por aqui. Já tenho uma paixão pela natureza que descobri na minha fase pré aposentadoria, o que me impulsionou para minha segunda graduação. Estou no último ano de Gestão Ambiental e rumo a minha horta urbana também.
    Sucesso pra vc!

    1. Rita, que delícia ler esse comentário! Muito obrigada, viu? E que incrível vc estar fazendo Gestão Ambiental. Ainda não é hora de aposentadoria… Volte sempre aqui. Um beijo!

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