Nina tem 2 anos e uma vida privilegiada. Seus pais, Rico Venerito e Thamiris Nascimento, são ligados a permacultura, plantam na cidade e buscam ter uma vida o mais conectada possível com a natureza.

“Colher o que temos em casa, como batata doce, maracujá, feijão, flores comestíveis e até cana de açúcar é algo que fazemos quase que diariamente. A Nina está encantada com a cozinha e com essa experiência de colher, lavar, fazer e depois comer. E assim, ela está tendo a oportunidade de participar do ciclo da vida”, conta Rico.

Ele mesmo cresceu em meio à natureza, embora sempre tenha morado na cidade.

“Sempre morei afastado do centro, em casa com jardim e horta. Com 13 anos eu já sabia fazer enxertia e alporquia. Com 19 anos tinha minha horta em casa. É uma cultura que veio do meu pai. Meus amigos vinham aqui, reclamavam dos insetos, tinham medo e eu achava estranho, porque convivia com insetos. Ter um jardim em casa foi muito legal”.

Isso, claro, moldou muito a forma como ele se coloca no mundo hoje. E ilustra o quanto ter experiências na natureza durante a infância é importante.

Nina descobre a natureza no quintal de casa, onde há muitas plantas comestíveis. Foto: acervo pessoal

Quando uma criança brinca na natureza ela descobre um mundo de infinitas possibilidades. Mais do que respirar ar puro, ela se encontra com desafios, precisa se concentrar, pratica a observação e, aos poucos, fica familiarizada com o mundo natural, incluindo os insetos, o que traz benefícios para ela, mas também para a própria natureza.

“O brincar é algo que traz essa afetividade com o espaço e a sensação de pertencimento. Então, por mais que seja escassa a natureza na cidade, é super importante que a criança tenha essa experiência. Porque é a partir dessas memórias afetivas que quando uma pessoa cresce ela vai ter essa vontade de estar presente e cuidar. É um benefício tanto para a criança no presente momento, quanto para o planeta. Tanto a criança precisa da natureza quanto a natureza precisa da criança”, diz Paula Mendonça, assessora pedagógica do programa Criança e Natureza, do Instituto Alana .

Rico é um exemplo disso:

“O C’alma (Espaço eco cultural que ele e Thamiris administram) é o reflexo dos nossos valores. Eu já tinha esse cotidiano de composteira, captação de água da chuva e separar resíduo para reciclagem antes disso virar uma coisa comum”, conta.

Do ponto de vista da saúde física, o contato com a natureza tem um grande impacto na prevenção à obesidade e problemas cardíacos, já que, em geral, brincar na natureza exige movimento ativo. Também traz benefícios oculares, porque a criança não fica em frente a uma tela, mas tem um horizonte amplo à sua frente.

Tem ainda a questão do gerenciamento do estresse e problemas de atenção, como o Transtorno de Déficit de Atenção. Estar na natureza pede concentração para encontrar soluções e enfrentar desafios, o que é muito rico para o desenvolvimento cerebral e estimula um estado de presença que traz mais calma e tranquilidade.

Paula diz:

“A natureza desafia através da sua diversidade de formas, texturas, matérias, que também aguçam a curiosidade, a criatividade e a imaginação da criança. A partir de brinquedos naturais que não são prontos, que chamamos de brinquedos não estruturados e são ofertados pela natureza, o desenvolvimento cognitivo e imaginativo da criança é potencializado”.

E como aproximar criança e natureza dentro da cidade?

Primeiro, é preciso entender que a cidade faz parte da natureza. Sem ela, nós, “seres urbanos”, não teríamos comida, oxigênio e água, que são itens fundamentais para a nossa sobrevivência.

O Projeto Criança e Natureza entende que o acesso da criança à natureza é um direito na infância e é fundamental que seja atendido dentro das cidades, onde grande parte das crianças vive e, por um conjunto de razões que vão da agenda infantil à qualidade dos espaços urbanos, passam 90% do dia em espaços fechados. “É preciso haver um planejamento de ações tanto do poder público, como da sociedade para que as crianças possam circular com maior autonomia nesses lugares, ter acesso à cidade”, diz Paula.

Por isso é importante ter praças, parques, hortas urbanas, arborização nas calçadas, canteiros, jardins, nascentes, rios e qualquer outra forma de natureza nos espaços urbanos.

As praças são bons espaços para as crianças terem contato com a natureza. Foto: Miriam Mello Franco/Coletivo Ocupe e Abrace

E para que esse contato de fato aconteça, é preciso ter, também, uma atitude proativa das famílias.

Paula dá algumas dicas de como isso pode acontecer no cotidiano:

  • Valorize a natureza que está perto

Um jardim em casa, alguns vasos com plantinhas, um canteiro na calçada podem ser um grande universo para as crianças explorarem. E isso precisa ser estimulado. “Do ponto de vista infantil, um pedacinho pequeno de jardim vira uma floresta e oferece experiências de grande valor”.

  • Ande a pé e pratique a observação

“Vá a pé a lugares mais próximos para poder andar e observar o caminho. E lembre-se que a natureza tem 4 elementos fundamentais: terra, água, fogo e ar. Portanto, proporcionar experiências ao ar livre já é um começo”.

  • Frequente o mesmo lugar com regularidade

“Ache uma praça pra chamar de sua. Para a criança, ir diversas vezes ao mesmo lugar é importante para criar intimidade. É uma experiência que marca a memória”.

Ir com as crianças a um espaço verde com regularidade ajuda a criar laços e vai beneficiar não só a criança, mas a natureza também. Foto: Maisa Infante
  • A natureza não é só o verde

“A experiência com a natureza pode ser vivida também no tempo, na observação dos ciclos. Instigue a criança a observar a lua e suas mudanças, a estação do ano, de quanto em quanto tempo ela tem sono. Observar o seu próprio ciclo e entender a sua própria natureza também é um contato que faz parte da natureza.

  • Use a janela

Como ainda estamos na Pandemia e está mais difícil sair de casa, vale usar a janela como um caminho para a observação da natureza. Olhe para o céu, ouça os pássaros, observe as nuvens, o vento, a chuva.

A natureza ensina de diversas formas. E jamais podemos esquecer que somos parte dela, que estamos totalmente integrados e dependemos dela para viver. Esse é um conhecimento importante de ser passado para as crianças, para que elas perpetuem isso ao longo da vida. Certamente, haverá benefícios não só pra elas, mas também para a própria natureza.

Quer dicas de lugares para aproximar criança e natureza? Aqui vão três sugestões (mas não vale fazer aglomeração)

Maritacas – Todos os dias, no fim da tarde, um bando de maritacas se aglomera na fachada de um prédio no Tatuapé. Elas se alimentam do barro do tijolinho usado na fachada do edifício e criam um espetáculo impressionante que, para ver, basta estar em frente ao prédio. É uma ótima oportunidade para observar as aves de perto, falar sobre os hábitos delas.

SAIBA MAIS SOBRE AS MARITACAS AQUI!

Praça da Nascente – Em Perdizes, a Praça da Nascente oferece a oportunidade de as crianças (e os adultos) terem contato com afloramentos das nascentes do córrego Água Preta. É um espaço cheio de elementos desafiadores para as crianças.

SAIBA MAIS SOBRE A PRAÇA DA NASCENTE AQUI!

Floresta de Bolso – No Largo da Batata, em Pinheiros, uma pequena floresta de Mata Atlântica pode ser visitada. O projeto foi desenvolvido pelo botânico Ricardo Cardim e é uma oportunidade de ter contato com plantas nativas de São Paulo e estar em meio a uma pequena floresta e seus desafios.

SAIBA MAIS SOBRE A FLORESTA DE BOLSO AQUI!

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